Cabo Anselmo reaparece em São Paulo e quer anistia
LUCAS FERRAZ
da Folha de S.Paulo
Um dos personagens mais controversos e polêmicos da história recente do país, cabo Anselmo deu ontem o último passo para voltar a ser José Anselmo dos Santos, nome de batismo do ex-marujo que precipitou a queda do governo João Goulart e marcou o início da ditadura militar (1964-85).
Vivendo clandestino e sem documentos oficiais há 45 anos, quando foi preso e expulso da Marinha, Anselmo fez na 8ª Vara da Justiça Federal de SP exame para comparar suas impressões digitais com as que constam em documentos disponibilizados pela Força.
Este é o último passo do processo em que a União foi forçada, em dezembro, a apresentar dados que durante anos foram considerados desconhecidos. A Marinha disponibilizou ficha "individual datiloscópica" e um "prontuário de identificação".
A cópia de sua certidão de nascimento não foi encontrada nos arquivos da corporação nem no cartório de Itaporanga d'Ajuda, no interior de Sergipe, onde ele nasceu e foi registrado --por isso a perícia.
Em pouco mais de 40 minutos, Anselmo tirou suas impressões digitais. A conclusão --que vai dizer se a pessoa que fez a perícia é o cabo Anselmo-- vai ser apresentada em 30 dias. Só depois ele poderá retirar novamente carteira de identidade, CPF e título de eleitor, e passará a ser o último dos beneficiados pela Lei de Anistia.
"Até que enfim", comemorou Anselmo. Para ele, ontem foi uma nova data de nascimento. "O pedido [para reaver os documentos] era para sair em 15 dias. Foram quase sete meses de espera."
Anselmo diz passar por dificuldades financeiras e está debilitado fisicamente. Aos 67 anos, anda com dificuldade, reclama de constantes dores no estômago e está prestes a ser operado por causa de uma hérnia duodenal.
Após reaver os documentos, o que ele mais espera é ter julgado o pedido de reparação protocolado na Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, em 2004, apesar de esperar pouco. Paulo Abrão, presidente da comissão, diz esperar a liberação dos documentos para o processo entrar em pauta.
"Estou tomando porrada há muito tempo", reclamou à Folha. "Esse pessoal da esquerda ainda inventa muita mentira", diz. "Há muita resistência no governo. Estão me enrolando já faz um bom tempo."
Líder da revolta dos marinheiros em 64, Anselmo atuou em várias organizações da esquerda armada, que ele próprio ajudou a destruir depois como informante do Dops (Departamento de Ordem Política e Social), em São Paulo. Era protegido do delegado Sérgio Fleury, um dos nomes mais associados à tortura e morte no período. O ex-marujo saiu de cena em 73.
"Ainda estou assustado, amedrontado, assombrado e tremendamente pressionado", afirmou cabo Anselmo, que deixou o prédio da Justiça Federal acompanhado por um ex-investigador do Dops, seu amigo Carlos Alberto Augusto.
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