sábado, 28 de fevereiro de 2009

Ministro Paulo Vannuchi sugere que famílias questionem Lei de Anistia na Justiça


(Da Tribuna da Imprensa)

O ministro-chefe da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, pediu ontem que vítimas da repressão do regime militar, seus familiares e entidades de classe se organizem nos estados para propor ações judiciais em massa questionando a abrangência da Lei de Anistia, que completa 30 anos em 2009. Em uma solenidade no Rio, ele defendeu que a sociedade civil intensifique a pressão para que documentos e informações sobre o paradeiro de desaparecidos políticos sejam revelados e informou que o governo prepara uma campanha publicitária com familiares de desaparecidos.

"Casos como o de Rubens Paiva e Stuart Angel não podem ser abandonados. Essa informação (o paradeiro deles) tem que aparecer", discursou Vannuchi na abertura da 8º Anistia Cultural, que julgou pedidos de indenização de 21 estudantes banidos de universidades durante a ditadura. "Não haverá nas Forças Armadas nenhuma pessoa com capacidade de dar informação sobre isso ou para transformar numa narrativa que o ministro da Defesa faça?", cobrou Vannuchi, que disse ter conversado sobre isso com o presidente Lula na semana passada.

Vannuchi informou que os ministros Dilma Rousseff (Casa Civil) e Franklin Martins (Comunicação) devem lançar até maio o sistema de acesso a dados de 14 arquivos estaduais, chamado Projeto Memórias Reveladas, com um edital que convoca donos de acervos particulares a transferir documentos para arquivos públicos. Segundo o ministro, Martins prepara uma comercial de TV em que aparecerão mães ainda vivas de desaparecidos políticos segurando fotos dos filhos e dizendo que não querem morrer sem saber o paradeiro deles.

Para Vannuchi, só a "saturação" provocada por um grande volume de processos mostrará ao Supremo Tribunal Federal (STF) que há uma demanda da sociedade por uma nova interpretação da Lei de Anistia, sem o perdão a torturadores. Até agora, o entendimento que prevalece é o de que os militares envolvidos em violações não podem ser processados por terem sido anistiados pela lei de 1979 como os militantes de esquerda que pegaram em armas, embora não tenham sido submetidos a qualquer processo investigatório que os identifique.

"Enquanto na Argentina, Uruguai e Chile, os familiares criaram centenas de ações, no Brasil, temos três, quatro, meia dúzia", argumentou. Para ele, talvez as vítimas da ditadura e seus familiares tenham subestimado a Justiça. Em entrevista na saída, Vannuchi disse que sua secretaria e o Ministério da Justiça continuarão o debate interno no governo até uma posição do STF. "A decisão do Judiciário pode não concordar com a minha, mas será respeitada por nós. Enquanto não há isso, não há como avaliar que o debate está encerrado, proibido. Não há como bloquear a força de 140 famílias que clamam pelo direito de ter o corpo de seus filhos, maridos, mulheres, irmãos para sepultar "

Durante o evento, o presidente da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, Paulo Abrão, pediu que movimentos sociais, intelectuais, imprensa e instituições também se mobilizem pela punição de torturadores e o esclarecimento de pontos nebulosos da repressão. A presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Lúcia Stumpf, afirmou que a entidade prepara uma série de manifestações no País em março que terão esse tema entre as reivindicações. "Temos direito de conhecer a nossa história.", defendeu.

A sessão da Comissão de Anistia, realizada na sede da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio, julgou 21 processos de estudantes universitários presos e impedidos de estudar sob a alegação de atividade subversiva. O decreto-lei 477, assinado pelo presidente Costa e Silva em 1969, permitiu a cassação de alunos e professores por oposição ao regime. Entre as indenizações concedidas hoje está a de familiares de ex-militantes de esquerda falecidos, como Luiz Gonzaga Travassos da Rosa, organizador do frustrado congresso da UNE em Ibiúna e um dos presos trocados no sequestro do embaixador americano Charles Elbrich.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Evento marca 40 anos da expulsão de UNIVERSITÁRIOS NA DITADURA

Brasília, 26/02/2009

Era 26 de fevereiro de 1969 quando o decreto-lei 477 sufocou o que restava de liberdade no movimento estudantil. O texto, assinado pelo presidente Costa e Silva cassou o direito de centenas de universitários de freqüentar as aulas e proibiu professores de ensinar. Quarenta anos depois, o decreto será lembrado na 8ª Anistia Cultural, marcada para o dia 27, às 10h, na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio de Janeiro.

O evento é promovido pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, em parceria com a OAB-RJ e a União Nacional dos Estudantes (UNE). Será realizado um ato público, com “sessão de memória” em homenagem aos perseguidos pela ditadura. Em seguida, a Comissão julgará cerca de 15 processos de pessoas que declaram ter sido atingidas pela norma de 1969.

Criado à sombra do Ato Institucional nº 5, de dezembro de 1968, o 477 se caracterizava pelo rito sumário. O decreto definia toda suspeita de “subversão” como infração disciplinar sujeita a punição. Professores e servidores eram demitidos e impedidos de trabalhar em qualquer outro estabelecimento de ensino por cinco anos.

Para os alunos, a pena era a expulsão e a proibição de estudar pelo prazo de três anos. Os bolsistas perdiam os benefícios e os estrangeiros eram extraditados. "O capital humano brasileiro foi afetado e é evidente que o prejuízo histórico e atual para o campo intelectual e para a potencialidade científica brasileira é imensurável", afirma o presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão.

Resgate da memória - em todas as regiões do país estudantes estiveram proibidos de entrar no campus e milhares de carreiras foram abortadas. Entidades representativas, como a UNE, passaram à ilegalidade. Houve tentativas de resistência, como na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), onde os alunos chegaram a organizar uma greve.

A situação, porém, perdurou até 1979, quando o decreto foi revogado pela Lei da Anistia. “Era um sentimento de morte civil. Uma situação muito desmoralizadora”, recorda o professor carioca José Geraldo, hoje reitor da Universidade de Brasília (UnB).

Em 1969 José Geraldo era estudante secundarista em São Paulo. Presenciou a expulsão de muitos universitários que nunca mais retornariam ao estudo. Anos mais tarde, atuou como advogado de alguns deles para exigir a reintegração. “No caso da UnB, o decreto 477 foi transcrito no próprio estatuto da universidade, que vigorou até a redemocratização”, conta.

Para o professor, que participará da 8ª Anistia Cultural, relembrar acontecimentos marcantes como esse é resgatar a memória e a verdade. “Serve para que mantenhamos a disposição de evitar que essas coisas voltem a ocorre”, afirma.
A frase tem a mesma conotação das palavras que o ministro da Justiça, Tarso Genro, tem dito: “Temos o dever da preservação da memória histórica e da reparação aos perseguidos politicamente".

Reitores de universidades federais e estaduais de todo o país foram convidados para o evento. Participam também o secretário especial de Direitos Humanos, Paulo Vanucchi, e os presidentes da OAB-RJ, Wadih Nemer Filho, e da UNE, Lúcia Stumpf.

Anistia Cultural

O projeto Anistia Cultural pretende dar visibilidade a fatos históricos ocorridos durante o regime militar, colocando o assunto na pauta social. O propósito é democratizar o acesso às informações, contribuindo para a formação cultural, humana e política dos jovens. Eventualmente, promove também sessões de julgamento.

A próxima edição do projeto está marcada para o dia 6 de março, em Brasília, em homenagem ao Dia Internacional da Mulher. O tema será: “Memórias do feminino: vivência, resistência e protagonismo nas lutas por democracia”.

Fonte: ACS-MJ

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Casa Civil amplia racha sobre anistia no governo LUCAS FERRAZ da Folha de S.Paulo, em Brasília

Enquanto para a Casa Civil não foram contemplados pela Lei de Anistia os agentes que cometeram "crimes comuns como lesão corporal, estupro, atentado violento ao pudor, homicídio, ocultação de cadáver e tortura" durante a ditadura militar (1964-1985), o Ministério da Defesa argumenta que "não é possível identificar autoridades" responsáveis pelos delitos e que o "esquecimento penal desse período negro da nossa história" contribui para o desarmamento geral.

A leitura das mais de 200 páginas encaminhadas por seis órgãos do governo ao STF (Supremo Tribunal Federal), que se posicionará sobre a real extensão da polêmica lei e a consequente punição de quem torturou durante o período, escancara ainda mais o racha sobre o assunto no governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

Ministério da Defesa, Itamaraty e Advocacia Geral da União querem o perdão aos torturadores. Já o Ministério da Justiça, a Casa Civil e a Secretaria de Direitos Humanos são favoráveis à punição. Os chefes dos três últimos órgãos combateram a ditadura.

Ao defender que não há previsão na Lei de Anistia sobre os crimes comuns cometidos por membros do Estado, a Casa Civil diz que "o que houve (...) foi o estímulo a uma interpretação distorcida dos conceitos apresentados na lei e amplamente favorável ao ocultamento e à impunidade dos crimes cometidos por agentes públicos do regime ainda vigente".

O órgão de Dilma, que esteve presa do início de 1970 até o final de 1973, cita ainda que o governo dos generais, que encaminhou a lei ao Congresso, nunca reconheceu a prática dos delitos, "de forma que tais crimes não poderiam se encontrar na gênese" da lei.

O Ministério da Defesa de Nelson Jobim, por sua vez, prefere o esquecimento, como se depreende da manifestação de 29 páginas. "Nem a repulsa que nos merece a tortura impede reconhecer que toda a amplitude que for emprestada ao esquecimento penal desse período negro da nossa história poderá contribuir para o desarmamento geral, desejável como passo adiante no caminho da democracia".

Nessa mesma linha, a Defesa, responsável pelas Forças Armadas, diz que a "anistia liga-se a fatos e possui caráter impessoal", não podendo ser aplicada a indivíduos.

A decisão sobre o tema ficará a cargo do STF, que mais uma vez decidirá sobre um tema do Executivo. O tribunal foi provocado pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).